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quinta-feira, 26 de julho de 2012

Mais pontos e contrapontos, contradições e dicotomias

Comentários/opinião
Veja-se nas matérias abaixo, dois grandes exemplos de contraditórios, cada vez mais espalhados por esse mundo, que estão se tornando um cotidiano cada vez mais repetido e repetido. No nosso Brasil, também. Será que a gente não consegue ser diferente? Por que?

Para poupar energia, Alemanha investe em edifícios inteligentes
O prédio da Daimler é o de cor amarelada e a textura do revestimento não revela que aquilo é cerâmica. No interior do edifício, o pé direito altíssimo termina em teto transparente. Cada feixe de luz natural é bem-vindo, o clima é agradável e não se vê sinal de ar-condicionado. No subsolo, 19 materiais diferentes são reciclados rotineiramente e, da cobertura, 20 andares acima, a visão dos arredores é de jardins suspensos: há verde em cada teto de edifício, um sistema natural de coletores de água da chuva. Os prédios dessa praça são ícone de sustentabilidade exibido com orgulho pelos alemães - trata-se da lendária Potsdamer Platz.
A reportagem é de Daniela Chiaretti e foi publicada pelo jornal Valor, 24-07-2012.
Em "Asas do Desejo", o clássico de Wim Wenders sobre a Berlim de 24 anos atrás, com Muro e dividida, Potsdamer Platz é um pedaço de terra arrasada no meio do nada. O retrato da desolação da Alemanha dividida tornou-se o maior canteiro de obras da Europa logo depois da unificação. No final dos anos 90, era símbolo da modernidade.

Satélites registram degelo recorde na superfície da Groenlândia
A cobertura de gelo da superfície da Groenlândia derreteu este mês em uma área superior à detectada em mais de 30 anos de observações de satélite, informou a Nasa esta terça-feira (24).
Segundo medições de três satélites diferentes analisadas por cientistas acadêmicos e da agência espacial americana, calcula-se que 97% da cobertura de gelo derreteram em algum ponto em meados de julho. "Isto foi tão extraordinário que a princípio questionei o resultado: seria real ou teria sido um erro nos dados?", disse Son Nghiem, da Nasa.
O especialista lembrou ter notado que grande parte da superfície congelada da Groenlândia parecia ter derretido em 12 de julho, ao analisar dados do satélite Oceansat-2, da Organização de Pesquisas Espaciais Indiana. Resultados de outros satélites confirmaram estas descobertas. Mapas do degelo demonstraram que em 8 de julho cerca de 40% da superfície congelada tinham derretido, uma área que aumentou para 97% quatro dias depois.

segunda-feira, 23 de julho de 2012

Ricos brasileiros têm quarta maior fortuna do mundo em paraísos fiscais

Comentários/opinião
Conforme abaixo, a partir de estudo de James Henry, ex-economista-chefe da consultoria McKinsey, e encomendado pela Tax Justice Network, os super-ricos brasileiros tinham em 2010 em paraísos fiscais o equivalente a quase 1/3 do PIB do Brasil nesse ano, que foi cerca de R$ 3,6 trilhões. Mas isso pode e ninguém se incomoda ou se preocupa com o fato.
E esses "fdps" ainda vivem reclamando de impostos exagerados. Exageradas e inomináveis são a sua sem-vergonhice, desfaçatez e patifaria. Mas eles detém, além do poder econômico, o poder político e o inteiro controle do poder institucional.
O que fazer? Eu, cá, sei muito bem, mas meus princípios de espiritualidade, religiosidade e humanidade não me permitem fazê-lo. Mas vou dizê-lo, usando um dito do meu velho pai, muito comum lá nas plagas da minha Bagé-RS de meados do século passado: "cachorro comedor de ovelha, só matando, mesmo". Será que não é merecido?
Publicado pelo IHU Notícias – 22-07-2012
Os super-ricos brasileiros detêm o equivalente a um terço do Produto Interno Bruto, a soma de todas as riquezas produzidas do país em um ano, em contas em paraísos fiscais, livres de tributação. Trata-se da quarta maior quantia do mundo depositada nesta modalidade de conta bancária.
A reportagem é de Rodrigo Pinto e publicada pela BBC Brasil, 22-07-2012.
A informação foi revelada este este domingo por um estudo inédito, que pela primeira vez chegou a valores depositados nas chamadas contas offshore, sobre as quais as autoridades tributárias dos países não têm como cobrar impostos.
O documento The Price of Offshore Revisited, escrito por James Henry, ex-economista-chefe da consultoria McKinsey, e encomendado pela Tax Justice Network, mostra que os super-ricos brasileiros somaram até 2010 cerca de US$ 520 bilhões (ou mais de R$ 1 trilhão) em paraísos fiscais.
O estudo cruzou dados do Banco de Compensações Internacionais, do Fundo Monetário Internacional, do Banco Mundial e de governos nacionais para chegar a valores considerados pelo autor.
Em 2010, o Produto Interno Bruto Brasileiro somou cerca de R$ 3,6 trilhões.
'Enorme buraco negro'
O relatório destaca o impacto sobre as economias dos 139 países mais desenvolvidos da movimentação de dinheiro enviado a paraísos fiscais.
Henry estima que desde os anos 1970 até 2010, os cidadãos mais ricos desses 139 países aumentaram de US$ $ 7,3 trilhões para US$ 9,3 trilhões a "riqueza offshore não registrada" para fins de tributação. A riqueza privada offshore representa "um enorme buraco negro na economia mundial", disse o autor do estudo.

sábado, 21 de julho de 2012

Chesnais: 'Estamos navegando em águas nunca dantes navegadas'

Comentários/opinião
Estou de acordo com o Chesnais, outro dos meus gurus muito admirados. Não quero ser presunçoso, mas não descarto a expectativa de que algumas das minhas ideias, expressas no livro "Capitalismo terminal" possam algum dia desses, no futuro, servir como primeiro esboço da carta náutica que Chesnais refere...
Em nível mundial, não se avista nenhuma “saída da crise” num horizonte temporal previsível. Assim como eu, outros já explicaram a necessidade inevitável, absoluta, de preparar-se para a perspectiva de uma grande quebra financeira e para tomar os bancos. Outro mundo é possível, certamente, mas não se poderá desenhá-lo senão na medida em que a ação abra caminho ao pensamento, o qual, mais do que nunca, não pode ser senão coletivo. No Século XVI, os navegantes ingleses forjaram a expressão “uncharted Waters”: águas nunca dantes navegadas, para as quais não havia carta náutica nem mapa algum. Hoje estamos nesta situação. O artigo é de François Chesnais.
François Chesnais - Sin Permiso

sexta-feira, 20 de julho de 2012

Mais chuva, mais seca, muito mais preocupação

Comentários/opinião
Muito interessante, essa matéria do Washington Novaes, um jornalista investigativo, do qual gosto muito. 
Talvez seja até meio assustadora. Começo a pensar no próximo 21 de dezembro e nos maias e seu calendário... Não sei muito bem porque, mas...
"Seminário da Unesp e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) em Pernambuco avalia (remaatlantico, 12/7) que o Nordeste é a região que mais sofre e sofrerá com as "mudanças do clima", seguido do Centro-Oeste. Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Manaus e Curitiba serão as cidades maiores com mais problemas", informa Washington Novaes, jornalista, em artigo publicado no jornal O Estado de S. Paulo, 20-07-2012.
Segundo ele, "reunidos na State of the Planet Declaration, 2.800 cientistas dizem que "o sistema Terra está em perigo".
Eis o artigo.
Enquanto estas linhas são escritas, chove há quatro dias em Goiânia - quando há 30 anos as chuvas no período de estiagem (de abril a setembro) eram tão raras que até nome tinham as duas habituais: "chuva das flores" e "chuva do caju". Algo parecido com o que se verificava também no Cerrado paulista antes que, a partir da década de 1950, a remoção da vegetação nativa e a entrada da cana-de-açúcar e da soja, principalmente, mudassem tudo e tudo fosse possível em qualquer época - chuva e estiagem, frio e calor até no mesmo dia. E hoje tudo acontece ainda no momento em que a calamidade é a rotina em mais de mil municípios nordestinos, com a pior seca em décadas. Mas nem a cidade de São Paulo escapa aos dramas, tendo chovido em oito dias do início de junho mais de 100 milímetros, o que não acontecia em década e meia (Agência Estado, 9/6).

quarta-feira, 18 de julho de 2012

A greve do ensino público e as engenharias

Comentários/opinião
Retomo a atividade de meu Blog, que tem andado meio abandonado em razão de tarefas muito desafiantes para mim, neste momento, 
É muito interessante e oportuno o artigo do professor Felipe Addor, que transcrevo na íntegra, a seguir. Ele coloca o dedo de um modo forte em feridas culturais do momento em que vivemos, decorrentes de distorções, esvaziamento e perda de valores éticos, sociais e humanos. São cutucadas que doem - ou deveriam doer - em muita gente.
Engenheiros deslocados da realidade de seu país, avessos às lutas dos trabalhadores e preocupados com seu próprio umbigo. Esses são os profissionais que queremos formar nas universidades públicas brasileiras?
Por Felipe Addor*, para o Canal Ibase
Afinal, em que mundo vivem os cursos de engenharia das universidades públicas brasileiras?
Na minha primeira greve como professor, tive a oportunidade de ver de outra perspectiva o mundo em que vivemos no ensino de engenharia em uma universidade pública. O que se vê é um retrato da formação que nossos estudantes recebem.
Após alguns dias acompanhando o vigor do movimento, resolvo aderir à greve. A essa altura, mais de 40 universidades públicas já estavam em greve. Reuniões, assembleias, mobilizações, passeatas, movimentação virtual; todos na luta por uma universidade pública, gratuita e de qualidade. Enquanto isso, no Reino da Tecnologia, a movimentação é quase nula. Ninguém sabe, ninguém fala, ninguém vê. Estacionamentos lotados, salas de aula cheias, restaurantes com as tradicionais filas.
Resolvi fazer uma última aula de debate sobre a greve. Nas trocas de ideias e argumentos, três questões subjetivas se destacam. Primeiro, a completa alienação sobre a situação. Para eles, que viviam naquela redoma tecnológica, nada estava ocorrendo; ou, pelo menos, nada que lhes dissesse respeito. “Professor, essa greve não vai dar em nada, quase ninguém está participando, só tem meia dúzia de professores”. Independente da posição dos professores das engenharias, é impressionante a capacidade de isolar seus alunos do mundo externo, do mundo real.
Segundo, a aversão às lutas dos trabalhadores. Embora essa palavra não tivesse saído em nenhum momento da boca dos estudantes, a clara impressão é que, na cabeça deles, grevistas são baderneiros, comunistas, preguiçosos; isto é, gente que não está a fim de trabalhar e que busca, por meio da greve, conquistar ainda melhores salários, mordomias; “esses professores querem que não haja avaliação para que subam na carreira e pedem melhores salários” (numa clara interpretação distorcida da proposta de novo formato de avaliação levada ao governo pelo Andes). Ou seja, estamos formando profissionais com a visão do patrão, do capital, em oposição ao trabalhador.
Terceiro, e mais pesado, é o enorme individualismo presente. Na verdade, é um individualismo burro, pois é imediatista. Preocupados com seus estágios, suas promessas de efetivação, suas possíveis oportunidades de concurso, suas viagens de férias, seus intercâmbios para a Europa, os alunos sequer consideram como algo relevante para suas vidas a luta por uma universidade pública decente, estruturada, de qualidade. É recorrente o argumento: os alunos são os únicos prejudicados, são as grandes vítimas das greves. Mentira, pois são os que mais se beneficiarão, no longo prazo, dos seus frutos. Não é preciso destacar que os avanços na estrutura e qualidade do ensino público superior (assim como as principais conquistas de lutas das classes trabalhadoras no mundo) são resultados unicamente das lutas travadas anteriormente (resumo das reivindicações e resultados das greves desde 1980: http://www.sedufsm.org.br/index.php?secao=greve).
O mais triste dessa última constatação é a consciência de que essa percepção individualista e imediatista é apenas o reflexo do raciocínio, da postura, dos ensinamentos da maioria dos professores dos cursos de engenharia em uma universidade pública. A corrente de vitimização dos alunos enquanto maiores prejudicados com a greve rompeu-se quando uma aluna disse: “eu defendo a greve, pois eu quero que, daqui a vinte anos, meu filho possa ter a oportunidade que eu tive de estudar de graça num dos melhores cursos universitários do Brasil”. O silêncio que se seguiu escancarava como aquela reflexão simples, ainda individualista, mas numa perspectiva inteligente, de longo prazo, foi um choque na estrutura de pensamento daqueles jovens e promissores engenheiros.
Engenheiros deslocados da realidade de seu país, avessos às lutas dos trabalhadores e preocupados com seu próprio umbigo. Esses são os profissionais que queremos formar nas universidades públicas brasileiras?
*Felipe Addor é professor do Departamento de Engenharia Industrial da UFRJ (Centro de Tecnologia), onde se formou em Engenharia de Produção. É fundador e pesquisador do Núcleo de Solidariedade Técnica da UFRJ (SOLTEC/UFRJ).

quarta-feira, 11 de julho de 2012

O futuro que não queremos

Comentários/opinião
Desnecessário se faz qualquer comentário e bem assim qualquer opinião adicional porque estou de pleno acordo com o articulista.
A reprodução abaixo é da publicação do IHU Notícias de hoje, 11-07-2012.


"Sem reduzir este consumo excessivo e planejar o crescimento econômico em prol dos necessitados não há solução para a crise social e ambiental. Sem compartilhar a riqueza, o saber e o poder a humanidade não sobreviverá. Só uma nova consciência e um novo paradigma de desenvolvimento podem responder a este desafio", escreve Marcos Arruda, economista, educador e associado do Instituto Transnacional, em artigo publicado no jornal O Globo, 09-07-2012.
Eis o artigo.
Duas clivagens dividem hoje a humanidade: entre a classe dos donos do capital e as classes que só possuem sua força de trabalho; e entre o bloco dos que professam a fé na acumulação ilimitada de riqueza material, ignorando que os recursos do planeta são finitos, e o bloco dos que já praticam uma socioeconomia fundada na sobriedade feliz, conscientes de que podemos ser felizes consumindo menos bens materiais e vivendo em solidária harmonia entre humanos e com os outros seres da Terra.
Apesar dos compromissos voluntários assumidos pelas elites nas Cúpulas oficiais (Rio92 e Rio+20), os indicadores dedesenvolvimento sustentável dos últimos 20 anos são estarrecedores: PIB global, +75%; emissões de carbono,+36%; degelo da banquisa do Ártico, +35%; ritmo anual de degelo das geleiras, +100%; população mundial, +26%; produção de alimentos, +45%; 1/3 deste total (1,3 bilhões de toneladas) é desperdiçado; desnutridos: mais de 1 bilhão, obesos: mais de 1 bilhão; agricultura usa 70% da água consumida; crescente desigualdade de renda como fator de geração de pobreza: renda mundial detida pelos 20% mais ricos passou de 82,7% para 91,5%; a fração dos 20% mais pobres caiu 20 vezes, de 1,4% para 0,07%; crescente desigualdade de expectativa de vida: para os 20% mais ricos, de 77 para 79 anos; para os 20% mais pobres, de 46 para 44 anos de vida (PNUD).
Estes indicadores comprovam o fracasso do Desenvolvimento Sustentável. Mas a avaliação dos resultados de 20 anos de tratados internacionais sobre pobreza, clima, gênero, biodiversidade, desmatamento e desertificação, água, emissões de gases-estufa, acidificação dos oceanos, degelo das calotas e geleiras foi retirada da agenda da Rio+20. Por que? Não devemos olhar para trás. É tempo de construir o futuro. Para disfarçar esse fracasso as grandes empresas lançaram a Economia Verde, não só para evitar a avaliação dos 20 anos de promessas vazias, mas para pintar de verde a economia de mercado, apresentada como o novo caminho de salvação da vida e do planeta.
Soluções efetivas além da retórica estão ausentes no documento oficial, O Futuro que Queremos. A Declaração da Cúpula dos Povos na Rio+20 é incisiva: As instituições financeiras multilaterais, as coalizões a serviço do sistema financeiro, como o G8/G20, a captura corporativa da ONU e a maioria dos governos demonstraram irresponsabilidade com o futuro da humanidade e do planeta e promoveram os interesses das corporações na conferência oficial. Em contraste, a vitalidade e a força das mobilizações e dos debates na Cúpula dos Povos fortaleceram a nossa convicção de que só o povo organizado e mobilizado pode libertar o mundo do controle das corporações e do capital financeiro.
As elites globais presentes na Cúpula oficial identificam o desenvolvimento sustentável com o crescimento econômico sustentado. No mundo atual, quase 90% do consumo global é atribuído aos 20% mais ricos. Sem reduzir este consumo excessivo e planejar o crescimento econômico em prol dos necessitados não há solução para a crise social e ambiental. Sem compartilhar a riqueza, o saber e o poder a humanidade não sobreviverá. Só uma nova consciência e um novo paradigma de desenvolvimento podem responder a este desafio.

quinta-feira, 5 de julho de 2012

Verso e reverso do espelho: o outro lado da cidade modelo

Comentários/opinião
É absolutamente emblemática a matéria divulgada hoje no IHU Notícias no sentido de demonstrar, mais uma vez, as contradições e as crueldades do processo de ganância vigente no mundo e no Brasil, sob formas até absurdas. Na verdade, e a bem dela, criminosas. E crime, como sabemos, deve ser punido com cadeia. Destaque-se que, em algumas sociedades, alguns crimes são punidos com supressão de partes do corpo e das próprias vidas dos criminosos. Se a moda pegasse...    
O outro lado da cidade modelo
Seu Francisco saiu de casa para olhar o movimento. Ficou curioso com tanta gente que desceu de um ônibus, quase todos com câmeras à mão e muitos falando outros idiomas. Perguntou o que estava acontecendo e explicaram a ele que os "turistas" eram pessoas de diversos países e do Brasil, jornalistas, pesquisadores e ativistas que estavam no Rio de Janeiro por ocasião da Rio+20 e foram conhecer de perto os impactos da siderúrgica TKCSA [Thyssenkrupp Companhia Siderúrgica do Atlântico] no bairro de Santa Cruz, na zona oeste da capital carioca. "É um perigoso isso aqui", comentou Seu Francisco, sobre a presença da empresa no local.
A reportagem é de Raquel Júnia, publicada no sítio da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz), 17-06-2012.

terça-feira, 3 de julho de 2012

A letra miúda do caos

Comentários/opinião
O título e o conteúdo do artigo do Saul Leblon na Carta Maior de ontem me fazem lembrar dois fatos que os nossos jornais da época noticiaram apenas nos cantos das suas vigésimas páginas.
Um, foi a solução final da moratória declarada pela Rússia em 1998, quando os seus credores, após seis meses inglórios de uma disputa feroz, acabaram concordando com os termos leoninos, do ponto de vista dos interesses soberanos do país, que tinham sido impostos pelo governo russo. Ora, direis, a Rússia tem a bomba. Mas essa não é a razão principal. Infelizmente não cabe aqui uma dissertação maior. A qual, aliás, está abordada no meu livro "E se o capitalismo acabasse?" e em outros escritos por aí.
Outro fato foi a audiência a portas fechadas e a sós, sem assessores, que Lula e FHC tiveram no Palácio do Planalto em 2002, entre a eleição e a posse, por precisamente 55 minutos. Isto – o tempo - a imprensa divulgou, muito "en passant". Desse encontro, uma formiguinha imaginária me contou sobre um acordo verbal, jamais escrito, mais ou menos nos termos a seguir.
Ao final do encontro, um – a formiguinha não sabia qual deles, mas isso não é relevante para esta minha fábula fabulosa – teria dito: "Você não mexe com o meu povo e eu não mexerei com o seu". Ao que o outro respondeu: "Fechado!". Apertaram-se as mãos, Lula foi embora, as bruxas não foram caçadas e o acordo valeu até o mensalão. O resto da história, até agora, todo o mundo conhece...
Ofereço um pirulito para quem descobrir as similaridades. Que são várias.
No último fim de semana, Atlanta, nos EUA, registrou a maior temperatura de sua história: 41 graus Celsius. A onda de calor foi sucedida de tempestades; vendavais com força equivalente a de um tufão também fizeram 13 vítimas em Washington, na sexta-feira, provocando destruição residencial e falencia no fornecimento de energia. A capital dos EUA está praticamente paralisada desde então, espremida entre o caos e ondas de calor, as mais elevadas dos últimos 135 anos. 
No centro e no sul da Espanha os termômetros atingem cerca de 40 graus: recorde histórico para o verão. Enormes extensões de bosques ardem no pior incêndio em duas décadas, que já consumiu cerca de 50 mil hectares na região da Valencia, em meio à seca infernal. As mais intensas chuvas de monções em uma década mataram dezenas de pessoas na Índia (*NR). Milhares de aves morrem de fome na costa peruana, por conta da escassez de cardumes decorrente do aquecimento anormal das águas do Pacífico, sinal de ocorrência do El Niño, fenômeno cíclico de efeitos magnificados num planeta cada vez mais vulnerável.
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segunda-feira, 2 de julho de 2012

Samuel Pinheiro Guimarães deixa o Mercosul com uma advertência: ou muda ou fica irrelevante

Comentários/opinião
É a tal coisa: muitos personalismos, muitos xenofobismos, muitas desconfianças recíprocas, muitos interesses subalternos, pressões declaradas ou subreptícias dos países centrais (leia-se EUA), poucos avanços no rumo da unidade regional, que deveria ser o desejado. Lastimável!
Para ser o que dele se espera, uma alavanca progressista de desenvolvimento regional integrado, o Mercosul precisa enfrentar a sua hora da verdade. Essa hora é agora, no curso da maior crise capitalista desde os anos 30, que abriu brechas e desarmou interesses, colocando em xeque dogmas e forças que ordenaram a criação do bloco, em 1991, por iniciativa dos governos Menem, Collor, Rodrigues Lacalle
A reportagem é da Carta Maior, 30-06-2012.
Movia-os então a certeza de o alinhamento regional às políticas preconizadas no Consenso de Washington, ancoradas em desregulação, privatização, livre trânsito de capitais e remoção de barreiras comerciais, seria suficiente para promover o desenvolvimento econômico e social. A concepção original, portanto, e os alicerces a partir de então assentados, não visavam o desenvolvimento econômico e social de cada Estado membro, menos ainda da região de forma associada.
Mercosul tem em seu DNA a determinação de ser um ponto de passagem, feito de desobstrução de barreiras e salvaguardas estatais, de modo a alcançar a plena inserção regional no espaço virtuoso dos mercados globais, conforme os preceitos do neoliberalismo. Esse vício politico de origem nunca foi corrigido de forma estrutural, tampouco a baixa densidade operacional daí decorrente foi superada a contento.
O fosso aberto entre passo seguinte da história e a rigidez de uma arquitetura desenhada para servir ao ciclo anterior, ora em colapso, ameaçam o Mercosul com o espectro da irrelevância diante dos desafios que a longa crise do neoliberalismo impõe aos governos regionais. Esse ponto de saturação exige respostas corajosas e iniciativas urgentes.
Foi para sacudir a modorra política e burocrática do bloco, que ameaça miná-lo como instrumento histórico do desenvolvimento regional, que o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, um dos estrategistas da política externa independente adotada pelo Itamaraty sob o governo Lula, renunciou nesta 5ª feira, ao cargo de Alto Representante Geral do Mercosul.
Leia o relatório apresentado por ele ao Conselho de Ministros do bloco.