Comentários/opinião
Eis o depoimento de uma experiência e uma visão extraordinárias. Aqui, melhor seria dizer "extra" ordinárias,
no sentido de fora do comum e tão ausente nos contextos vigentes de burrice,
estupidez , ganância e desconsideração para com os seres humanos.
Médicos cubanos no RS. Um depoimento.
Publicação do IHU Notícias , 27-08-2013
"A saúde, quando eficiente, se manifesta em
linguagem universal, todos acabam entendendo, não importa se é formatada por
cubanos, brasileiros ou canadenses. Até porque os pacientes somos todos,
inclusive os médicos. O momento atual atesta que se precisa rever o SUS, a
partir da saúde e não da doença", afirma José Alberto Wenzel,
ex-secretário de Saúde de Santa Cruz do Sul, RS, no artigo "Uma experiência local", publicado pelo jornal Zero Hora, 27-08-2013.
Referindo-se à presença de médicos cubanos no município,
ele testemunha: "Foi uma reviravolta no sistema de atendimento básico à
saúde. Em determinada ocasião, se pretendeu transferir um dos médicos cubanos
para outra unidade do PSF, hoje seria ESF, Estratégia de Saúde da Família.
Tivemos que manter o médico em sua unidade original, tal foi a manifestação de
apoio da população, exigindo sua permanência. Noutra ocasião, tivemos alguns
problemas com a manutenção de um deles, tanto que tivemos que tomar as
providências cabíveis".
Eis o artigo.
O Palácio de Convenções de Havana estava
lotado. Era o dia 28 de novembro de 1997, data de encerramento do 6º Seminário Internacional de Atenção Primária de Saúde.
O tema do evento Salud para Todos en Cuba, falava
por si. Profissionais, gestores, gente de muitos países, haviam passado quatro
dias trabalhando saúde pública básica e preventiva.
Convidados a conhecer unidades do Programa de Saúde da Família, visitamos um posto onde o
médico também residia. Cada morador da área de abrangência do posto estava
identificado em fichas, onde constavam os dados pessoais, familiares, laborais
e sua situação de saúde, bem como os procedimentos que vinham sendo adotados,
ou seja, havia um prontuário, que era atualizado a cada visita do médico,
enfermeiro e equipe responsável por aquele quarteirão.
De volta a Santa Cruz do Sul,
não se teve dúvida. Foi instalado o Programa de Saúde da Família
(PSF), que já se organizava e implantava em algumas cidades
brasileiras. Entre as dificuldades, surgiu a questão dos médicos. Era
necessário disponibilizar à população adstrita à Unidade Básica de Saúde da Família um médico,
enfermeiro e equipe de agentes de saúde, em turno de oito horas diárias, com
visitação efetiva às famílias. Alguns médicos se disponibilizaram, mas foi
necessário buscar outra alternativa: contratamos dois médicos cubanos, pagos
nos mesmos termos que os demais médicos locais.
Num primeiro momento, surgiram as dificuldades
comuns, como alugar casa, arrumar avalista, enfim instalar os profissionais e
integrá-los à comunidade. Como haviam passado por Brasília, já vinham com a
condição de atuação temporária validada.
Foi uma reviravolta no sistema de atendimento
básico à saúde. Em determinada ocasião, se pretendeu transferir um dos médicos
cubanos para outra unidade do PSF, hoje seria ESF, Estratégia de Saúde da Família.
Tivemos que manter o médico em sua unidade original, tal foi a manifestação de
apoio da população, exigindo sua permanência. Noutra ocasião, tivemos alguns
problemas com a manutenção de um deles, tanto que tivemos que tomar as
providências cabíveis.
O
que ficou desta experiência em Santa Cruz do Sul? Primeiro, que o programa exige o trabalho em equipe,
formada por médico, enfermeira, agentes comunitários de saúde e outros
profissionais julgados necessários à determinada comunidade. Segundo, há que se dotar a unidade de atenção básica da
estrutura adequada. Terceiro, nenhuma
unidade funciona como uma ilha, há que integrá-la ao sistema de saúde. Quarto, o sistema não é apenas de abrangência nacional,
estadual, intermunicipal; ele precisa ser operado resolutivamente dentro da
estrutura local, envolvendo a unidade básica, as especialidades, urgências,
hospitais e demais instituições ligadas à área. Por fim,
a saúde, quando eficiente, se manifesta em linguagem universal, todos acabam
entendendo, não importa se é formatada por cubanos, brasileiros ou canadenses.
Até porque os pacientes somos todos, inclusive os médicos. O momento atual
atesta que se precisa rever o SUS, a partir da saúde e não da doença.*Ex-secretário de Saúde de Santa Cruz do Sul